Meu
quarto estava inundado pela escuridão dessa madrugada tão fria. Revirei, virei,
desdobrei em minha cama umas trocentas vezes, tentando achar um lugar nela que
me traria calma, mas foi em
vão. Procurei pelo meu maço de cigarro que estava em cima da
cabeceira e fui atrás de uma xícara de café - um vício incessante -
sentei na poltrona que ficava ao lado da janela, traguei meu
cigarro e caí em profundo desvaneio. Lembrando daquela tarde de outono, que
acabara com todo aquele sentimento que ainda restava em mim […]
- Não cansas de ser tão fria Joana? Parece que pouco se
importa com o que estou passando. - Seus olhos azuis eram penetrantes, sempre
tivera uma força no olhar. Principalmente quando eu o zangava
- Sabes o jeito que sou. Não gosto de me envolver. Me
conheceste assim oras, porque reclamas agora? - Falei me desviando daquelas
duas esferas azul caribe.
- Achas que eu não tenho o direito de reclamar? Achas que eu
não mereço mais de você? Joana, tu conheces aquilo que me amedronta, nunca te
escondi nada.. Me conheces do jeito que eu sou. - Agora seus olhos encaravam os
meus com intensidade, queria desviá-los, olhar para o lado, mas já era tarde demais,
eles já haviam me hipnotizados (…)
Meu cigarro se desfez em minha mão, queimando um de meus
dedos. Somente assim para me fazer despertar dessa lembrança que só corroía meu
peito. Minhas lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e agora eu só
enxergava um borrão em minha frente, nada mais fazia sentido algum, nem mesmo
este meu café frio apoiado em minhas pernas. Dei uma olhada pelo meu quarto e
me surpreendia com as coisas que nele estavam espalhadas. Ali, no canto direito
de minha cama, toda amarrotada, estava a sua camisa. Aquela que eu usara no dia
três de Janeiro (…)
- Não podemos mais ficar confinados neste quarto meu bem. -
Minha voz foi abafada pelo som de seu coração, seu peito estava quente.
- E por que não? Gosto daqui. De passar o dia, virar a noite,
chegar a madrugada. Gosto do seu corpo nu junto ao meu, de nossas carícias.
Este fim de semana está sendo perfeito. - Ele respondeu num tom de zombaria,
mas sabia que ele estava levando a sério. Então eu ri. - A propósito, gosto
dessa tua risada.
- Este fim de semana é de longe o melhor de toda a minha
vida. Mas entenda que temos uma vida lá fora. - Disse levantando-me e vestindo
tua camisa branca com listras verdes claras.
- Está camisa fica melhor em você do que em mim. Te deixa sexy. - Eu
sorri e ele me puxou novamente para teus braços (…).
Estava respirando com dificuldade, sentia meu peito inchar e
chiar de segundo em
segundo. Peguei mais um cigarro e notei que este era o
último. Droga, pensei.
Dei um bom gole no meu café frio, acendi meu cigarro e atravessei meu quarto
para me martirizar mais ainda. Sentei em minha cama, peguei sua camisa que
estava toda surrada e me embrulhei nela como se esta fosse seus braços. Minha
garganta se fechou na mesma hora, criou um nó que nem eu mesma conseguia
desatar. Cheirei seu colarinho mas teu cheiro já havia ido embora. Não, não, não. Teu cheiro deveria estar aqui, você
é quem deveria estar me envolvendo e não esta tua camisa amarrotada. Resmunguei
aos choros.
Sinto a sua falta meu amor. Sinto falta de quando você me
irritava ou bagunçava meu cabelo, de quando ficávamos abraçados em minha cama e
ficava mordiscando minha orelha(…) Sinto falta dos teus carinhos, de sua risada
tímida. Me desculpe por não ter sido perfeita para você, por não ter ficado ao
seu lado quando você precisou de mim. Tento me esquivar todos os dias daquela
nossa tarde de outono, não quero me lembrar o quão estúpida eu havia sido. Eu
apenas… Apenas… Queria uma última chance para ver teus lindos olhos azuis
novamente (…).
- Senhorita Fortunatto? - Na mesma noite daquela tarde de outono,
fui acordada por um policial, exatamente as duas da manhã, não queria me
levantar, mas ele insistia em tocar a campanhia e então fui recebê-lo.
- Eu mesma. - Disse sonolenta - O que desejas? - Demorei um
pouco para perceber que um policial estava em minha porta.
- Me desculpe pelas circunstâncias senhorita, mas por acaso
conheces algum Lucas Bertozzi?
- Sim. - respondi apreensiva.
- Então preciso que me acompanhes. Sinto-lhe informar mas o
Lucas acabou de sofrer um acidente, infelizmente ele não sobreviveu ao impacto
(…).
Lembro-me daquele dia como se tivesse sido horas atrás.
Minhas pernas ficaram bambas e meu coração disparou. Para mim, eu estava em um
sonho, ou melhor, pesadelo. Não queria acreditar no que estava acontecendo. Só
de saber que desperdicei meus últimos momentos contigo… Ó meu amor, se
soubestes o que eu daria para recuperar aqueles minutos. Se soubestes como me arrependo
de não ter me entregado totalmente a você. De não ter lhe falado o como eu te
amava… Eu só estava com medo meu amor, medo de entregar-me de alma e coração e
depois perdê-lo. Mas do que adiantaste não é mesmo? Foi-se embora da mesma
maneira e me deixaste aqui… Despedaçada. Me roubaste a vida. A vida me roubaste
você e fez com que levasse meu coração junto a ti. Agora não resta-me nada.
Somente meu cigarro, minha xícara de café - já vazia - e esta tua camisa
amarrotada(…).